Friday, October 17, 2008

Escrevi isto há uns tempos, acho que não ficou lá muito bem


esta sala,
cheia de coisas velhas,
até as coisas novas são velhas;
tudo tem 40 ou 50 anos,
não os objectos em si,
mas sua presença aqui,
e não consigo imaginar idade mais velha.

aqui foram crianças meus tios,
local de cerimónia,
lugar proibido,
onde adultos contavam histórias a pais,
que as entendiam com atenção,
bebiam líquidos turvos,
de frascos preciosos,
enchiam a sala de fumo,
e usavam palavras altas e fortes
que não eram para crianças, para tios

superfícies brancas e curvadas,
sofás verde-dourado
de toque aveludado,
cadeiras antigas de Portugal,
banquinhos africanos,
um gigante mapa com o império a rosa
livros que só o meu avô compraria
– A Empresa Socialista na Jugoslávia,
Técnicas de Explosões e de Vários Trabalhos com Explosivos –
latas de Baygon de agora (verde-insecto e vermelho-cor-de-sangue)

os meus tios correm pequenos e ligeiros,
sigilosamente,
por esta sala,
abrem gavetas,
roubam charutos, chocolates,
com o coração aos pulos,
espreitam homens importantes da janela que dá para o corredor,
espreitam a sua vez

2 Comments:

Blogger Manel said...

ta muita bom pa!
mas agora vai masé estudar neurologia pá!

2:27 AM  
Blogger Pico said...

A sofia de mello breyner anderson explicou melhor e com muito menos palavras

"Este é o amor das palavras demoradas

Moradas habitadas

Nelas mora

Em memória e demora

O nosso breve encontro com a vida"

3:01 AM  

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